Ozempic: entenda a disputa judicial sobre a patente da semaglutida

A patente da semaglutida, princípio ativo de medicamentos como Ozempic e Wegovy — usados no tratamento de diabetes e obesidade e que se tornaram fenômeno mundial — está próxima do fim no Brasil.
O registro expira em março de 2026, e a Novo Nordisk tenta estender o prazo alegando que o processo de análise do pedido ficou anos parado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O órgão, no entanto, nega a possibilidade de ampliação e afirma que a legislação brasileira não permite esse tipo de compensação.
Entenda disputa
A discussão surgiu após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2021, que considerou inconstitucional parte do artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial. O trecho garantia que toda patente teria validade mínima de dez anos a partir da concessão.
“Foram 13 anos para conseguir a patente da semaglutida. O INPI sempre foi um dos órgãos de patentes mais lentos do mundo. Esse prazo de dez anos após a concessão era uma forma de compensar essa demora”, disse a diretora jurídica da Novo Nordisk, Ana Miriam Fukui Dias.
Com a decisão do STF, o prazo passou a ser de 20 anos contados a partir do depósito do pedido, que aconteceu em 2006, sem prorrogação. A regra valeu de forma imediata para o setor farmacêutico, o que, de acordo com a empresa, reduziu parte do tempo de exclusividade dos medicamentos.
A Novo Nordisk afirma que não busca ampliar o prazo da patente, mas recuperar o período em que o processo teria ficado parado dentro do INPI. Segundo a companhia, houve cerca de sete a oito anos de inércia administrativa, sem movimentação do pedido.
A empresa defende que o tempo pedido não seria uma extensão, mas uma reparação pelo atraso causado por um agente público. A alegação se apoia em trecho do voto do ministro Dias Toffoli, relator da decisão do STF, que admitiu a possibilidade de empresas prejudicadas buscarem ressarcimento judicial caso comprovem dano concreto.
“Não estamos pedindo os 13 anos de volta, mas o tempo em que o processo ficou completamente parado e não houve nenhum avanço. O que queremos é a recomposição de um período perdido”, diz Conrado Carrasco, gerente de Assuntos Corporativos da farmacêutica.

O que diz o INPI
Em resposta, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial informou que o pedido de extensão de prazo contraria a decisão do STF, que rejeitou expressamente a possibilidade de ampliação do tempo de vigência das patentes por demora administrativa.
Além disso, o órgão afirma que a proteção é contada desde a data do depósito, e que o titular pode licenciar a tecnologia ou buscar indenização retroativa se houver uso indevido.
Segundo o instituto, os longos prazos de exame ficaram no passado. Em 2024, o tempo médio para decisão de um pedido de patente farmacêutica foi de 4,9 anos para fármacos e 5,7 anos para biofármacos, bem abaixo dos índices de 2018, que superavam nove anos.
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O INPI afirmou ainda que trabalha para reduzir o prazo médio geral para dois anos até 2026, com medidas como digitalização de processos, uso de inteligência artificial e contratação de novos examinadores.
“A alegação de demora do INPI não justifica a extensão do prazo de proteção da patente. A decisão do STF protege a segurança jurídica e a previsibilidade necessárias ao sistema de propriedade industrial”, diz a nota enviada ao Metrópoles.
O órgão destacou que o entendimento do Supremo já foi confirmado em mais de 30 decisões judiciais e reafirmado em quatro reclamações constitucionais.
“Decisão alinhada à prática da maioria dos países”
Para o pesquisador Pedro Henrique Batista, do Instituto Max Planck para Inovação e Concorrência, na Alemanha, a exclusividade temporária garantida pela patente é fundamental para estimular o investimento em pesquisa, mas deve ter duração limitada.
“A patente corrige uma falha de mercado, permitindo que o titular recupere seus investimentos em inovação. Mas, após esse período, a queda é essencial para ampliar o acesso da população a medicamentos e reduzir preços”, explica.
O pesquisador afirma que a decisão do STF de 2021 reduziu o tempo de exclusividade de algumas empresas, mas trouxe previsibilidade ao mercado e está alinhada à prática da maioria dos países.
“Poucos países admitem a extensão de patentes por demora do órgão público. O Brasil, ao afastar essa possibilidade, se aproxima de modelos como os da União Europeia, Japão e Suíça”, destaca Batista.
Segundo ele, com a expiração da patente da semaglutida em 2026, a expectativa é que versões genéricas e biossimilares do princípio ativo comecem a ser desenvolvidas e, futuramente, levem à redução de preços e maior acesso a tratamentos de obesidade e diabetes.
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